Autor: Marcelo Augusto Antonelli
As respostas do treinador, sobre como agir em determinadas situações, transformam-se em uma “verdade absoluta”, quando ele não se preocupa em contextualizá-las e não induz ou pelo menos abre espaço aos jogadores para realizar uma reflexão critica sobre as mesmas.
Pelo contrário, muitas vezes, quando essas reflexões ocorrem, elas podem ser consideradas como “comportamento inadequado” (indisciplina) pelo treinador. Os atletas também poderão interpretar equivocadamente essa contextualização como um sinal de falta do conhecimento do treinador que gerou duvidas nos atletas.
Se pensarmos em categorias de base, e jogadores que durante anos são treinados pelo mesmo treinador, ou por treinadores de um mesmo clube ou escola de futebol, que seguem “a linha” (e as verdades) de um mesmo coordenador, a situação pode se complicar ainda mais.
A capacidade de entendimento, leitura e adaptação do atleta (capacidades táticas) às diversas situações apresentadas contra variadas equipes, estará restrita aos “ensinamentos” de um treinador que crê ter lecionado aos atletas todas as respostas, e que provavelmente não compreendera porque eles não conseguem reagir como esperado.
As chances de que o sistema tático seja compreendido em suas linhas gerais serão grandes, mas há um enorme risco de que os atletas não estejam aptos a executá-lo de forma eficaz durante a partida, caso eles não tenham uma profunda compreensão das razões pelas quais eles executam determinadas funções. Ainda assim, atletas realizando funções para não “desapontar” ou “desrespeitar” o treinador, sem compreender o motivo pelo qual realizam as mesmas, é uma prática muito comum no futebol.
Uma cena comum: treinadores gritando à beira do gramado e reclamando que os atletas não conseguem compreender a partida, mesmo “ele tendo ensinado mil vezes a mesma coisa”. E é exatamente ali o problema. A memorização de conceitos não funciona no futebol; é necessária a compreensão dos mesmos, para uma adaptação e reação eficaz durante a partida.
Umas das soluções para isso é uma abordagem construtivista, na qual os atletas participem da implementação do sistema, sendo desafiados a encontrar a soluções de problemas e resolvê-los, guiados pelo treinador, ao invés de receber dele respostas prontas. Essa abordagem deve também fomentar a prática de diferentes estilos de jogo, para que os jogadores possam compreender como funcionam e, conseqüentemente, desenvolvam as respostas às situações que serão apresentadas contra equipes que jogam nestes estilos.
No entanto, alertamos para o fato de que essa abordagem apresenta muitas dificuldades na sua execução, como o longo tempo de implementação do esquema tático, resultado do tempo de adaptação dos atletas para resolver cada problema; e a desconfiança que isso poderá gerar entre atletas, pais, dirigentes e torcedores, que poderão atribuir os períodos longos e o excesso de questionamento à falta de compreensão do esporte pelo treinador.
Apesar das dificuldades que um treinador pode encontrar através de uma metodologia que inspire analises crítico-reflexivas, defendemos essa prática, pois acreditamos que, em médio e longo prazo, leve os jogadores a um maior desenvolvimento das capacidades táticas e, conseqüentemente, a maiores chances de sucesso dentro do futebol.
Deixamos uma questão ética. Se o treinador não irá trabalhar em longo prazo com o jogador, o que é mais importante: colher resultados em um curto período de tempo, focalizando na implementação do sistema tático, ou se preocupando também com o desenvolvimento do atleta, mesmo que os frutos sejam colhidos somente quando o comandado já estiver em outra equipe?
Não acreditamos em uma visão dicotômica dessa situação, já que a implementação do sistema tático pode ocorrer conjuntamente com o desenvolvimento das capacidades táticas. O treinador deve considerar a idade dos atletas envolvidos e o momento da temporada. Quanto mais jovens, e quanto maior a distância até o campeonato principal, mais tempo deveria ser utilizado para o desenvolvimento das capacidades táticas.
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